Redução do ICMS: quem vai pagar essa conta?

jul 7, 2022 | Mídias

Seguindo a lei federal que impôs um teto para Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis, energia elétrica, telefonia e internet, ao menos 20 estados já anunciaram reduções como tentativa de conter a inflação e o alto impacto dos preços no bolso dos consumidores.

Pelo texto sancionado no dia 23 de junho pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), esses ítens passaram a ser classificados como essenciais e indispensáveis, o que impede que os estados cobrem taxa superior à alíquota geral de ICMS, que varia de 17% a 18%, dependendo da localidade. Até então, os combustíveis e outros bens que o projeto beneficia eram considerados supérfluos.

“Não há almoço grátis”

A notícia é boa para aliviar, ao menos minimamente, o bolso de quem vinha sofrendo com tantos aumentos seguidos.

Nas últimas semanas, os preços do litro do diesel e da gasolina alcançaram os maiores valores nominais para os combustíveis desde que a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) passou a fazer o levantamento semanal de preços, lá em 2004.

De acordo com o levantamento da ANP, o valor médio do litro do diesel estava a R$ 7,568, sendo que o maior valor encontrado foi de R$ 8,990. O preço médio do litro da gasolina estava a R$ 7,39, com valor máximo encontrado a R$ 8,890. Já o preço médio do etanol estava a R$ 4,873, sendo o preço mais caro R$ 7,890.

A redução, porém, trará perdas bilionárias de receita para os estados. A estimativa é que os governos estaduais percam R$ 83 bilhões na arrecadação, o que pode afetar os recursos de investimentos em outras áreas.

Por isso, ainda pode ser cedo para comemorar. É o que explica Fernando Umezu, coordenador do curso de economia da ESEG – Faculdade do Grupo Etapa. “Como disse Milton Friedman, ‘não há almoço grátis’. Assim, investimentos e despesas dos estados e municípios terão que ser cortadas, ou compensadas pelo aumento de outros impostos”.

 

No final das contas, a sociedade/contribuinte irá bancar essa conta.”
Fernando Umezu, coordenador do curso de economia da ESEG – Faculdade do Grupo Etapa

Com essa possível contrapartida em vista, Umezu destaca que, no caso dos combustíveis, como o giro de estoque é rápido, já houve quedas em torno de R$ 0,60. Valor maior do que o estimado pelo governo do Estado de São Paulo, por exemplo, que previa uma redução de cerca de R$ 0,48. “No caso dos outros itens, os preços deverão baixar, mas só serão percebidas à medida que os vencimentos dos serviços forem ocorrendo” explica.

Segundo o economista, por causa da redução, espera-se que o IPCA de julho caia, podendo chegar a valores negativos. “A medida afetará a inflação tanto pelo efeito da própria redução dos combustíveis, da energia elétrica, da internet e dos planos de celular, quanto pela redução destes custos em outros produtos comprados pelo consumidor”.

Redução por estado

 

Até a manhã desta segunda-feira (4), os seguintes estados adotaram a medida: Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, São Paulo e Amazonas, além do Distrito Federal.

Sudeste

  • Minas Gerais: redução do ICMS da gasolina de 31% para 18%;
  • São Paulo: redução do ICMS da gasolina de 25% para 18%. Queda estimada no preço de R$0,48/litro;
  • Espírito Santo: redução do ICMS da gasolina de 27% para 17%. Queda estimada no preço de R$ 0,81/litro;
  • Rio de Janeiro: redução do ICMS da gasolina de 32% para 18%. Queda estimada no preço de R$ 1,19/litro.

Sul

  • Santa Catarina: redução do ICMS da gasolina e etanol para 17%;
  • Rio Grande do Sul: redução do ICMS dos combustíveis para 17%;
  • Paraná: redução do ICMS da gasolina de 29% para 18%. Queda estimada no preço de R$ 0,50 a R$ 0,60/litro.

Centro-Oeste

  • Goiás: redução do ICMS dos combustíveis de 30% para 17%;
  • Distrito Federal: redução do ICMS dos combustíveis ara 18%.

Nordeste

  • Bahia: preço da gasolina está fixado em R$ 4,91;
  • Ceará: redução do ICMS dos combustíveis para 18%;
  • Rio Grande do Norte: redução do ICMS da gasolina e etanol para 18%;
  • Paraíba: três decretos sobre o ICMS foram publicados. Até o momento, não ficou definido se o estado adotará os 18% previsto na nova lei.

Norte

    • Amapá: redução do ICMS de 25% para 18%;
    • Rondônia: redução do ICMS dos combustíveis para 17,5%;
  • Roraima: redução do ICMS da gasolina e etanol de 25% para 17%;
  • Pará: redução do ICMS da gasolina para 17%. Queda estimada no preço de R$ 7,44 para R$ 6,50/litro.

O que dizem as entidades

Combustíveis – Para Carlo Faccio, diretor do Instituto Combustível Legal (ICL), a medida que vem sendo adotada pelos estados garantirá a simplificação tributária, unificando as alíquotas para melhor controle arrecadatório dos impostos.

“A simplificação tributária é uma das linhas estruturais de combate à sonegação e à inadimplência, porque quanto maior é o tributo, maior é o interesse em tentar fraudar o erário pelos oportunistas de plantão. Com a redução do ICMS, automaticamente reduz-se o interesse de se utilizar o setor de combustível como um dos elementos irregulares”, defende. De acordo com o ICL, estima-se que as perdas com sonegação e inadimplência ultrapassam R$14 bilhões anualmente.

Já para a Associação Brasileira de Revendedores de Combustíveis Independentes e Livres (AbriLivre), o limite de alíquotas de ICMS para combustíveis atrapalha o desenvolvimento do setor, além de não garantir a redução dos valores.

Isso porque que há outros fatores relevantes que impactam o preço, como a cotação do dólar norte-americano, o preço internacional do barril, a política de preços da Petrobras e os preços praticados pelas distribuidoras.

“Para haver uma redução concreta nos preços dos combustíveis, é essencial que a Petrobras reveja a sua política de preços, hoje baseada na paridade do preço internacional, para aquela baseada em seus custos reais de produção e importação e uma margem razoável de lucro aos acionistas da estatal”, diz Rodrigo Zingales, diretor executivo da AbriLivre.

Outras ações apontadas por Zingales como necessárias para que os combustíveis fiquem mais baratos é que haja uma maior concorrência no elo da distribuição e que, além da redução da alíquota do ICMS, se crie uma trava do valor máximo do ICMS a ser cobrado em termos absolutos, além de a base de cálculo considerar o preço efetivamente cobrado ao consumidor, e não a média.

“Isso porque, sem a referida trava, qualquer aumento nos preços dos combustíveis na refinaria também gerará um aumento no valor absoluto do ICMS, que impactará negativamente no aumento dos combustíveis comercializados ao consumidor. A cobrança do ICMS baseada no valor efetivamente cobrado do imposto, e não naquele médio, evitará o fenômeno da bitributação, presente hoje no atual modelo de cálculo desse tributo”, complementa.

Comunicação – Para a presidente da Federação Nacional de Call Center, Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática (Feninfra), a lei vai imprimir mais investimentos em conectividade de telecomunicações.

Sendo assim, a notícia pode ser boa para o consumidor: “O fato de o setor de telecomunicações ser altamente competitivo vai contribuir para que o limite do ICMS cause efeito nos preços dos serviços”, destaca Vivien Mello Suruagy.

Em nota técnica divulgada em maio, a Anatel apontou que a redução da carga tributária terá que ser repassada para o consumidor, mesmo que traga perdas para as operadoras. Segundo o órgão, reduzir a alíquota para 17% resulta em redução geral de 11% no preço final aos consumidores.

Suruagy ressalta que a carga tributária brasileira é a mais elevada no mundo, e que é preciso que haja uma mudança. Segundo a presidente da Feninfra, a área de telecomunicações paga, anualmente, cerca de R$ 62 bilhões em tributos, e a medida pode estimular também a expansão do setor, garantindo empregos, gerando novas investimentos e ampliando a conectividade.

“Não há sentido em estabelecer valores que inibem a digitalização do país e penalizam o consumidor, que está sobrecarregado com inflação de mais de 12%. Precisamos de incentivos aos investimentos e redução tributária”, defende.

Para o presidente da CDL/BH, Marcelo de Souza e Silva, a medida reacendeu a esperança de uma reforma tributária e administrativa mais transparente e justa, além de estimular o consumo da população.

“A estipulação de um teto da alíquota ajudará na redução de até 1% na inflação projetada. Isso colabora para a redução da pressão sobre os juros, estimula os mercados e atrai investimentos. A redução dos impostos é essencial para o avanço econômico, estímulo ao consumo e geração de emprego e renda”, diz.

Estados já deveriam respeitar o teto da alíquota desde 2021

A exigência de alíquotas superiores nos bens e serviços essenciais é ilegal por desrespeitar o princípio constitucional da seletividade ou essencialidade. É o que explica André Félix Ricotta de Oliveira, advogado, professor e doutor em direito tributário.

O especialista destaca que o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu, no ano passado, que o ICMS não pode ter alíquota superior a 17% sobre energia elétrica e serviços de telecomunicações, entendendo que seria inconstitucional a exigência de alíquotas superiores nos bens e serviços essenciais.

“O problema é que os estados sempre abusaram de alíquotas superiores a 17 e 18% sobre bens e serviços essenciais, em total desrespeito ao princípio da seletividade ou essencialidade, que está devidamente previsto na Constituição Federal, estipulando, de forma discricionária, as alíquotas do ICMS sobre bens e produtos essenciais, levando como pressuposto a possibilidade de maior arrecadação do ICMS, independentemente da essencialidade da mercadoria ou do serviço para os consumidores”, aponta.

Segundo o tributarista, a medida da redução é um reflexo da decisão que já foi dada pelo Supremo Tribunal Federal. “Já deveriam os estados respeitarem a seletividade desde a Constituição federal de 88. Mas como nunca fizeram, o STF deu um recado que eles devem respeitar. Então, os estados têm que mudar a tributação do ICMS e tributar os produtos essenciais (como energia elétrica e combustíveis) com alíquotas menores, e deixar as maiores para produtos supérfluos, que não são essenciais para a sociedade”.

 

Fonte: https://www.inset.com.br/economia/reducao-do-icms-quem-vai-pagar-essa-conta

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